Entrevista: A Água Nossa de Cada Dia

Setembro/2001

Maurício Luiz Sens, engenheiro sanitarista, professor doutor em engenharia ambiental, com ênfase no tratamento de água, do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFSC coordenador do Laboratório Integrado de Meio Ambiente (Lima).

Os assuntos principais são poluição hídrica e métodos de tratamento de água

Depois da energia, a próxima crise vai ser originada pela falta ou má qualidade da água?
Todo mundo fala isso. Acabei de chegar de viagem, estive com os maiores especialistas do Brasil que estavam discutindo justamente sobre o tratamento de água… Tivemos dois dias de reunião dessa rede de pesquisa, a nível nacional. Eles falam também da crise da água. Eu tenho uma visão diferente. Eu acho que nós só teremos crise de água se realmente não houver investimento, como foi o caso da eletricidade, mas se dominar as técnicas… acho muito difícil faltar água.

Inclusive no Nordeste?
Inclusive no Nordeste, porque no Nordeste tem água salgada, tem água salobra. Mesmo no sertão nordestino, se faz um poço e se encontra água salobra. E tem técnica prá tratar isso, tanto que já estão colocando isso. Só que a falta de um pouco de preparo, digamos… é coisa de principiante, estão iniciando e estão tendo alguns problemas, mas é possível resolver. Nós temos água do mar em grande quantidade. Dá prá tratar. Por exemplo, aqui, em Florianópolis. Hoje nós estamos trazendo água de 35 quilômetros de distância…Tem uma boa parte de manancial subterrâneo na ilha, que pode ser consumida e antes nem se falava… Então, se pensava que, em 2005, começaria a buscar água em Tijucas, no rio Tijucas, que dá uns 60 e poucos quilômetros… (…) Mesmo assim, as técnicas de desalinização se modernizaram e baratearam bastante, através de osmose inversa.

Como é esse procedimento de osmose inversa?
É uma membrana, de um lado se concentra o sal e do outro, sai uma água pura. Extremamente pura. Prá nós, brasileiros, ainda está caro. Na Europa e nos Estados Unidos também ainda continua sendo caro, mas cada vez está mais barato…

O que é caro?
Os materiais. A construção é mais simples. Nessa técnica não tem quase construção de concreto, coisas assim… É uma casinha comum, a gente coloca esses equipamentos e fica tratando da água. Mesmo assim, como nós não dominamos a tecnologia, isso tudo é importado… Quer dizer, algumas pessoas, mesmo eu que já trabalho um pouco com osmose inversa, dominam a tecnologia, mas não temos ainda o material. Hoje, nós somos dependentes da membrana, que tem um tempo de vida. Então, a minha visão é a seguinte: se não tiver investimentos, vai ter crise de água. Como o caso da eletricidade… o brasileiro tinha completo domínio da situação elétrica do País, sabia que isso ia estourar faz tempo… Eu vinha escutando isso desde 15 anos atrás… Só que não houve vontade política, não houve investimento como deveria, o que aconteceu? Privatização… só pensam em privatização, privatização… e não se investe mais nada porque tem que privatizar e chegou aí… Com a água também tá acontecendo isso… Querem privatizar as companhias de saneamento, a Casan … O que tá acontecendo? As companhias estão lutando prá não acontecer, por outro lado, o governo também não sabe como fazer direito… Daqui a pouco, então, poderá haver a crise de água em todo o País porque não tem investimento… Agora, técnica, conhecimento, nós temos, tanto que podemos usar água salgada, água salobra e águas superficiais. Nós podemos, teoricamente, tratar até água de uma fossa séptica. É mais caro e mais difícil, mas dá prá deixar tão potável quanto as outras.

Quanto custam essas membranas?
Eu não tenho o valor por metro cúbico… tem que saber pela produção de água. Isso depende do porte dessas instalações, mas essa técnica costuma ser bastante cara. Veja, há cinco anos, eu estive na França e estavam montando lá um laboratório com 200 pesquisadores com um objetivo: desenvolver membranas de ultra-filtração, nano-filtração e de osmose para tornar essas técnicas, em dez anos, mais baratas do que o tratamento convencional. Hoje, nós temos uma estação convencional com processo de coagulação, decantação, filtração e desinfecção… Com essa técnica de membranas, tudo isso é eliminado. Mesmo a desinfecção não será necessária. Só um residual para a rede, caso haja uma contaminação depois porque nessas membranas não passa nem vírus nem bactéria.

Quer dizer que não há necessidade de cloro também?
Como desinfecção na estação, não. A gente vai continuar colocando cloro por conta de uma possível contaminação depois, mas a água que passa pela membrana já sai desinfectada. Quer dizer, se aplica na saída da estação uma certa quantidade de cloro na água potável para que, na rede, se houver uma infiltração… Mas o que se chama de desinfecção na estação, matar os vírus que tem ali, não será mais necessário. Então, esses pesquisadores franceses tinham o objetivo, há cinco anos, de tornar essa técnica mais barata. Prá isso montaram o laboratório com 200 pesquisadores. Quer dizer, agora só faltam cinco anos prá atingir esse objetivo. Digamos, daqui a cinco anos, talvez eles consigam prá eles, mas nós, brasileiros, ainda vamos ter um tempo mais… porque nós vamos ser dependentes dessa tecnologia.

Porquê essa membrana é tão cara?
Tem o preço da membrana, ela é de celulose, mas é a tecnologia prá fabricar que torna caro. São poucos no mundo que fabricam essa membrana de osmose. Depois tem a membrana das técnicas de ultra-filtração e nano-filtração, que, hoje, já se aplicam para outros tipos de efluentes, não para água potável, porque é muito cara. Tem estações de emergência, onde se aplicam essas técnicas. Os árabes já têm essa desalinização por osmose inversa. Companhias francesas montaram estações lá, tudo é tratado com essa tecnologia. Dentro da França também tem. Às vezes, por osmose, outras por ultra-filtração e nano-filtração. (…) Então, porquê é tão caro? Além da membrana, essa técnica precisa de alta pressão. Precisa de conexões e tubulações que agüentem alta pressão, sistema de bombeamento que dê essa alta pressão, válvulas… esse conjunto todo começa a encarecer também porque não tem tanto fabricante quanto esses de peças comuns. E, prá nós, vai ser ainda mais caro porque nós vamos comprar de fora. A partir do momento que esses fabricantes se instalem no Brasil ou as empresas nacionais entrem em conjunto com outras e comecem a fabricar partes ou toda essa tecnologia, isso se tornará mais barato também. Eu acredito nisso, mas precisa de investimento. Se realmente a nossa política nacional continuar como está… Isso sem sombra dúvida, estou falando e nem sou um dos maiores especialistas nacionais, mas, sem sombra de dúvida, vamos começar a ter problemas e vai começar a faltar água… e isso vai ser muito mais rápido do que imaginamos. Porque não tem investimento.

E o Brasil é privilegiado em termos de recursos hídricos. Nós temos a maior reserva de água doce do planeta…
Nós somos ricos em águas subterrâneas, mas tudo tem seu preço. Aqui, dentro da universidade, nós fizemos três furos, de cento e vinte metros. Conseguimos água, mas não na quantidade que se pretendia. A água também tinha muita concentração de ferro. Quando se pesquisa água subterrânea, de qualquer maneira, também tem um preço porque a gente erra. Ninguém enxerga exatamente o que tem lá embaixo. Então, uma parte desses furos é perdida. Às vezes, a água não é de boa qualidade, mas mesmo assim a gente tem técnica prá tratar essa água subterrânea. Por exemplo, nós fizemos uma estação de tratamento de água para o Campus universitário. Temos o projeto executivo prontinho prá tratar a água subterrânea e sermos auto-suficiente em água no Campus. Se quisermos. Nós temos condições, se associando com a Eletrosul, que nós forneceu um outro curso que tinha boa vazão. Porém, todos esses poços tem muito ferro. Hoje em dia, até é fácil tratar isso. Então, basta executar e poderemos ter água à vontade. Digamos, aqui na ilha, nós vamos furar e encontrar água que não é boa, então tem que furar mais adiante… Então, nós somos ricos em água subterrânea, mas tem que ter investimento. Não é de graça. A água subterrânea tem a vantagem de que podemos, às vezes, fazer poços mais perto da cidade, mais perto do consumidor. No nosso Estado, nós temos água, rio em todos os lugares. Só que, hoje, todas as águas subterrâneas estão poluídas. No oeste do Estado, nós temos problemas com a produção de suínos. Tem nitratos e nitritos na água. Aqui, em volta de Florianópolis, vai começar a faltar água mesmo. Água superficial. Mas, com a água subterrânea, que hoje a gente sabe que tem, dá prá ir bem longe, mas vamos ter que tratar do mesmo jeito.

Os dados de organizações ambientais registram que 80% das doenças e 65% das internações hospitalares no País são causadas pela má qualidade da água. Isso é correto?
Os dados não são bem esses. Normalmente, até 85% das doenças no nosso País são causadas pela água de má qualidade. A nível mundial, 65% das doenças vem pela água. É a média mundial. Dos internações hospitalares, é 25%. No mundo. Por causa de doenças de origem ou transmissão hídrica. É um percentual exorbitante. E onde é que o governo deveria aplicar recursos? Qual é o nosso maior problema? O primeiro, que eu acho, é a saúde. Se 85% das nossas doenças vem pela água… onde é que tem que atacar? Tratando da água, você resolve dois problemas. Agora, por causa disso que tem que privatizar, tem que privatizar… Até países europeus que adotaram isso há um tempo, estão voltando atrás. A Argentina teve que recomprar um sistema, pagando dez vezes mais. E nós estamos engatinhando prá isso e, com isso, não se investe mais. Todo investimento está trancado porque a política é forçar para fazer a privatização. Então, não vem dinheiro do governo federal nem do Banco Mundial e as companhias não conseguem ter caixa prá fazer novas estações de água, rede de esgotos. Só se está fazendo coisa do passado. Essa nossa rede de esgoto é de contrato antigo.

A água, como a energia, é um insumo fundamental.
Mais fundamental que a energia…

Então… como se pode subordinar isso à perspectiva de lucro?
Exato. Eu também penso assim. Veja, eu não sou uma pessoa de companhia. Eu estou dentro da universidade, meu trabalho é outro, posso continuar fazendo pesquisa em água ou, de repente, até ser mais agraciado com uma companhia dessas que venha, seja nacional ou de fora. Digamos, posso ter até mais trabalho de consultoria… Mas eu não defendo a privatização. Eu acho que eles estão indo para o lugar errado porque não tem como ter concorrência na água. Como é que você vai colocar dois ou três tubos distribuindo água na cidade? Não é como a TV a cabo, que conseguiu uma certa concorrência. Então, na água vai ser um monopólio. Ou privado ou estatal. Como é que nós vamos entregar a água pro monopólio privado? Evidentemente, que vai custar mais caro. Já o que não era prá custar mais caro, o telefone, tá bem mais caro… A água é um monopólio mesmo, não tem saída. O que vai acontecer? Florianópolis vai ser da empresa X, Joinville vai ser da companhia Y… isso dá prá fazer. Mas lá em Joinville ou aqui, em Florianópolis, vai ser uma só companhia que vai tratar a água ou o esgoto. Ah, dizem: vai ter um controle do governo… Quem é que vai confiar nisso num País desse com tanta corrupção? Não vai ter controle, quem vai realmente "entrar pelos canos" é o povo. Vai pagar mais caro. Na Argentina, estão pagando bem mais caro. E o pior: eles só colocam água ou rede de esgoto onde vai dar lucro. Eles não tem a parte social. Hoje, o que acontece com uma companhia do Estado? Aqui dá lucro, outro lugar não tá dando lucro… Ela se compensa e vai fazendo a expansão. O "privado" não quer saber. Aquele cara do morro, que tá meio isolado, não vai ganhar água. Isso é o que tá acontecendo na Argentina, apesar de eles quererem mostrar que não. De cara, eles começaram a fazer isso. Não tem investimento, eles querem primeiro o lucro. Agora me deram a informação que o sistema da cidade de Córdoba teve que ser recomprado porque deu a maior confusão com a população. Eles tinham vendido por 40 milhões de dólares, tiveram que recomprar por 400 milhões. Então, na minha visão, a privatização, pelo menos do jeito que está se tocando, é catástrofe. Além do mais, está sendo feito tudo prá não ficar com companhias nacionais. Eles não estão privatizando um sistema. Quando se fala em privatizar a Casan, se fala em privatizar a companhia em todo o Estado, que tem 219 municípios e 300 e poucos sistemas de tratamento de água. Então, começa a se acertar somente o "filé mignon". Eles começam a privatizar o filé como foi em outras coisas, onde dá lucro: Florianópolis, Joinville…

Quanto do território catarinense é atendido pelo tratamento de água e esgoto?
Nós temos 90 a 95% de rede de água, no meio urbano do Estado. Meio urbano. Esgoto é 7 ou 8%. Com isso, você pode fazer uma subtração. Praticamente toda a água distribuída volta ao ambiente como esgoto. O que se distribui de água deveria retornar por um tubo prá rede de esgotos, prá tratar, mas retorna para o manancial, para um corpo d'água. Polui. É despejada no ambiente. Então, se dos 95% distribuídos só 7% são tratados… Oitenta e poucos por cento da água é poluída.

Nas grandes cidades, o índice de perdas é de quase 50%. Ou, seja, quase metade dessa água tratada é perdida por problemas de infra-estrutura ou falha na manutenção…
Esses dados são corretos. Em nível nacional, tem lugares com mais que isso. Tem outros com menos. Prá você ver: o nosso Estado é um lugar onde o nível de vida é bom comparado com outras regiões do País, mas nós perdemos 49,5%. Não é só perda de água. Perda de faturamento também. Coisas que, às vezes, não precisariam ser computadas. Tem caso de favelas, onde é distribuída a água e só é cobrada a taxa mínima, não hidrômetro, um equipamento que mede o consumo de água. Então, se não tem o equipamento, a pessoa desperdiça, consome à vontade, não conserta uma torneira estragada… Então, isso é perda de faturamento. Numa nova construção, a Casan não coloca imediatamente um hidrômetro, começa a cobrar só a taxa mínima… Tudo somado, incluindo até órgãos do próprio governo que não pagam, dá 49,5% de perdas.

Quais são os grandes poluentes da água e quem produz?
Hoje, no nosso Estado, em todo o oeste catarinense, é a criação de suínos. Eu não tenho dados exatos, mas, se não me engano, a população de suínos é maior do que de pessoas. E o suíno gera uma poluição, eu tô chutando…Acho que o grau de poluição produzido pelo suíno corresponde ao de três a cinco pessoas. Então, dá prá se ter idéia do grau de poluição causado pelo suínos. Parte disso tem o devido tratamento dos dejetos, mas outra parte não tem.

E as outras indústrias?
Ali, na região norte, Blumenau, Joinville, o maior problema é o têxtil. No sul, nós temos o carvão como principal poluidor. Depende das características econômicas da região. Porque todo mundo usa água. Veja, a indústria têxtil: prá produzir mil quilos de tecido, se usa um milhão de litros de água. E essas águas saem coloridas, conforme a cor do tecido do dia. No nosso Estado, de qualquer maneira, existe tratamento dessa água na maioria dessas indústrias. O que falta um pouco é fiscalização prá controlar o sistema. Às vezes, de madrugada, isso fica desligado…

As indústrias estão reusando água? Qual é a capacidade de reutilização da água?
Eu tive procura pelas próprias companhias de água prá fazer reuso porque a própria estação de tratamento de água também é uma poluidora, por incrível que pareça. O que acontece com a maioria das estações, 99% delas, no Brasil… nós pegamos a água de um rio, tiramos toda a sujeira que vem com essa água, acrescentamos alguma coisa e devolvemos pro rio. Então, agora isso mudou, a legislação. Qualquer mudança que se faz numa estação de água tem que se adequar prá tratar esses efluentes. Por exemplo, um filtro. Quando se lava um filtro, o lodo é jogado fora. Agora, não. Então, as próprias companhias têm nos procurado prá fazer estudos para poder reciclar essa água que se perde da lavagem de um filtro, de um decantador, prá retornar ao sistema. Hoje, a gente tá fazendo isso sem perda nenhuma de água. Só sai os sólidos, tudo retorna ao sistema. Na maioria, isso não está implantado, mas têm estudos prá isso. Eu fui procurado há muitos anos, doze anos atrás, pela indústria da Pepsi Cola prá fazer um estudo para reciclar a água da lavagem dos vasilhames.

Nas residências ou em condomínios é possível reutilizar a água? O Sr. tem um colega que fala que usar a água tratada para lavar calçada ou dar descarga em banheiros é um desperdício porque essa água é muito nobre.
Muito se pensou nisso, mas não é bem assim. Fica complicado fazer mais de uma rede dentro de uma cidade, dentro de uma residência ou prédio. Depois, tem a higiene, essas coisas… Nos vasos sanitários, se poderia, de fato, jogar uma outra água, mas nós temos que armazenar ou, então, tinha a idéia de ter só a água potável e separar na utilização. Por exemplo, a água de chuveiro… o cara toma uma ducha e essa água é separada. Mas o condomínio teria que ter cisterna prá isso, condicionar essa água prá reciclar prá todo prédio, utilizar essa água nos vasos… Não é algo prático. Essas idéias, às vezes, são boas, mas não é fácil fazer. É como a idéia de recuperar o gás produzido pelo lixo. Já se fez, até aqui no Estado já tivemos locais piloto, onde uma indústria recuperava o gás da putrefação do lixo e utilizava, mas não é fácil. Não dá prá colocar o lixo tão perto, ele tá longe, nós não temos uma boa técnica de pressurização prá engarrafar o gás… então, a indústria tava ali do lado de um lixão desse, canalizava, mas eram uns trambolhões de tubulação por cima… Era medonho, não tinha uma estética… As idéias são boas, mas ainda não é fácil implementar. Então, creio que ainda não é algo assim tão interessante.

E esse projeto executivo que o Sr. fez de uma estação própria de tratamento da água no Campus?
Na verdade, isso foi feito há alguns anos, em outra gestão, com outro reitor. Depois, não foi abraçado por esta. Mas eu também não procurei mais o pessoal prá conversar. (…) A nossa idéia era manter só 10% da água da Casan. Seria uma estação-escola operada por estudantes. Como nós temos que formar alunos que saibam tratar a água, então nós já iríamos operar com estudantes. Nós iríamos coletar a água de três, ou melhor, de dois poços. A gente iria abandonar um porque não ficou próximo. Eram dois poços da universidade e mais um poço da Eletrosul, que nos cedeu, já temos os documentos. Essa quantidade de água que se tem é boa, embora tenha que tratar porque tem muito ferro… Mas nós projetamos também uma estação prá remover o ferro, que ficaria ao lado da piscina. Ao mesmo tempo, a mesma equipe poderia tratar a água da piscina e manter essa estação para água potável, que ficaria numa área não muito nobre da universidade porque fica do lado da piscina, entre a Eletrosul e aquele canal próximo da piscina. Lá em cima do Morro (da Cruz) tem dois reservatórios. Um, hoje, é da universidade. Então, nós lançaríamos toda a água direto naquele reservatório prá vir pro Campus, mas manteríamos uma ligação de água, estrategicamente, prá não se desvincular da Casan. Não é interessante, caso tenhamos algum problema…

O Sr. falou que isso seria traria economia para a universidade. O Sr. tem idéia de quanto a universidade gasta com água?
Hoje, não tenho mais. Na época em que a gente fez esse estudo, esse projeto de tratamento, a universidade pagava… Bom, primeiro, a gente fez um trabalho para controle de perdas e desperdício de água. A gente reduziu sensivelmente, uns 30% do consumo de água. A universidade pagava 42 mil dólares de água e passou a pagar U$ 26 mil. Mas, hoje, o consumo cresceu. Tem mais prédios sendo construídos, mais equipamentos, tudo usa água… A tendência é subir se a gente não faz esse controle para baixar o consumo ou, pelo menos, estabilizar. Eu creio que a universidade deva estar pagando em torno de 60 mil dólares. Já ouvi falar em 65 mil dólares, já baixei cinco porque achei um pouco demais. Também tem essa diferença de câmbio, o dólar tava mais próximo do real, agora não tá mais e os preços da água não sobem em dólar. Mas mesmo se pensar em uns 30 mil dólares, já é um bom dinheiro, multiplicado por 2.5, dá 75 mil reais por mês…

A idéia do projeto era utilizar só 10% de água da Casan…
É, embora o projeto possa eliminar por completo esse vínculo, mas eu não acho interessante. Estrategicamente, a gente manteria um vínculo com a Casan. Se, eventualmente, as coisas não andassem direito, a gente teria água da Casan.

O Sr. falou que a água subterrânea aqui do Campus têm muito ferro. Quais são os metais pesados que podem estar presentes na água e de onde eles vêm?
Os metais pesados estão mais na zona industrial, eles vêm do despejo industrial. Tem vários, conforme a região. Esse ferro que nós falamos aqui, apesar de ser um metal, ele não é prejudicial à saúde. Porque nós temos que tratar? Porque a água fica amarela, ela tinge os vasos sanitários, mancha as louças… Também é a questão do visual, ninguém gosta de beber uma água amarelada. No nosso caso aqui, a água tinha um teor muito forte. Ela sai do poço cristalina, mas em questão de vinte minutos, meia hora, ela se torna alaranjada porque começa a oxidar o ferro que antes, sem a presença do oxigênio, não estava oxidado, ele estava dissolvido e completamente transparente. Depois, em contato com o ar, ele oxida e torna-se amarelo. Mas prá saúde não tem nenhuma contra-indicação. Também tem os problemas de incrustração nas tubulações. Com o tempo, começa a incrustrar e fechar um pouco as tubulações, as vazões diminuem. Isso causa um sério problema. Também pode criar bactérias ferruginosas que atacam certos metais, etc. Às vezes, pode mudar o gosto de certos alimentos, o café não sai com o mesmo gosto, etc. Mas nada contra-indicado prá saúde.

O que é, realmente, essencial para garantir a sustentabilidade dos recursos hídricos?
Tratar a poluição. O que a gente quer com a sustentabilidade é manter o recurso. Então, se a gente tiver esses mananciais tratados, nós vamos poder reutilizar mais vezes a água, com facilidade. Cada vez mais o tratamento se torna sofisticado, mas nós não estamos fazendo a sofisticação que deveria. Esse é um grande problema. As nossas águas estão ficando piores porque nós continuamos fazendo um tratamento convencional. Só que os despejos não são mais os convencionais. Então, se a água tem metais pesados, pelo tratamento convencional, sai muito pouco. Pesticidas, agrotóxicos… Não falei ainda de agrotóxicos. Esse é outro grande poluidor no nosso Estado. Nós não estamos preparados para tratar a água com agrotóxico. Então, esse sistema não elimina. Eu já fiz testes, só elimina 2% do agrotóxico. A gente sabe como tratar, tem como fazer isso nas estações, mas nós não temos isso nos sistemas.

E o caso de pilhas e baterias que são jogadas em lixões e contaminam o lençol freático?
Tudo isso contamina, se não fizer um aterro sanitário. Primeiro, nós temos que ter aterros sanitários no Estado, já não temos. Depois, aterro industrial. Só temos um, parece que vamos ter dois… De qualquer forma, quase não temos aterro sanitário industrial. Então, na verdade, essa pilha tem que ser recuperada, mandada de volta pro fabricante. Mas nós temos outros problemas… Por exemplo, essas empresas quando tratam o seu despejo, sobra um lodo que é rico em metais pesados e tem que ir para um aterro sanitário industrial. Mas nós temos poucos aterros sanitários e aterro sanitário não é o que todo mundo pensa, que é um lixão ou, às vezes, um aterro controlado. Tem que ter toda uma base antes construída para que quando tenha a putrefação, aquele líqüido, o chorume, vá também para uma estação de tratamento de efluentes. Um aterro sanitário tem até uma estação de tratamento do efluente dela se não ele será um poluidor e fortemente, com metais pesados. Sem ser um aterro industrial, um aterro sanitário comum… Porque tudo que nós temos, isso aqui (um folheto colorido) tem metal…metal pesado. É papel, mas sobra metais na putrefação…Isso tem que ter um tratamento.

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