Dia 23 de março no ano da graça de 1956, abri os olhos na Carlos Corrêa
e com 6,2kg a enfermeira logo disse que valia por dois. Sabe lá... vai ver é aquela
parte que me instiga à gula até hoje.
Como não tive pai, Deus me agraciou
com duas maezonas: Domá e Aninha. Minha infância não foi longe do quadrilátero
Crispim Mira, Monsenhor Topp, Major Costa e Mauro Ramos. Aos cinco anos corri
em disparada com uma legião de moleques até a praça dos Bombeiros atrás do avião
em chamas da Esquadrilha da Fumaça. Sem saber que o destino fatal da aeronave
era a pracinha do Kioski, olhei em volta e estava perdido. Uma boa alma me levou
de volta a casa. Dali começou minhas andanças. Saía dos Canudinhos,
atravessava a creche da LBA, pegava a General Bittencourt, dobrava na Travessa
Argentina, subia a Artista Bittencourt e seguia pela Araújo Figueiredo passando
em frente ao TAC e chegando no grupo Lauro Müller para a primeira aula com a dona
Tonolli, mãe do Saulzinho Oliveira e colega da minha, Lindomar Martinelli e de
dona Clarisse, dona Meta, dona Francisca, dona Sinova e uma plêiade de professoras
abnegadas pelo ensino. Aos nove seguimos para o difícil exame de admissão no moderníssimo
Instituto Estadual de Educação. Inglês, francês, desenho, artes e outras
"artes" entre as novas amizades. Também na altura, um novo bairro. Sai da Ilha
para morar em Coqueiros, num casarão das famílias Vaz Viegas, contraparente de
minha irmã mais velha, Nina Lúcia Machado, casada com o Palito - professor e guru
Ney Cláudio Franzoni Viegas. Ali na rua 14 de Julho, embaixo da ponte,
de frente pro mar, a maresia, as ostras nas pedras, os siris Goiás, as pescarias
com tio Beck nas canoas de garapuvu do Zé Feijão e os mergulhos das proas dos
navios argentinos em troca de um "cigarrijo" marcaram minha adolescência como
também as pescas na baleeira Pampeiro lá pras bandas da Caieira do Norte. Nesse
tempo, volta e meia, usando a grana do ônibus para mais um pastel, retornava da
Ilha no "carcanho" ressabiado com os trilhos em frestas da ponte Hercílio Luz
onde se avistavam barquinhos na fronteira molhada das baías. No lado Continental
conheci avós de amigos meus que tinham trabalhado na ponte. Outros no estaleiro
Arataca e alguns nas fábricas do Hoepcke... muitas histórias. E veio o
Praia Club, Jovem Guarda, violão às costas, peladas e frescobol. E veio a "ponte
nova", o fim do bairro e a volta pra Ilha. Pracinha do Kioski, rock and roll,
surf, letras, universidade e jornalismo. Estudos, trabalhos, o casamento com Carin
Silva e os filhos Pedro e Juliana. E com as labutas, as lutas... não à ditadura!
Em meio às perdas, as vitórias: A chegada da neta princesa Aroha. E os
anos se seguem. Estamos firmes, mas tal qual a ponte Hercílio Luz, precisamos
de reparos e restauros para continuar sendo elo do mundo girante que nos leva
acima e abaixo todos os dias. O que nos faz agradecer a Deus e pedir que nos abençoe
em mais um ano de vida. E rogar pra que não deixem essa ponte cair. Parabéns Floripa!
Vamos festejar no Ricaldinho da Ilha! |